sábado, 25 de dezembro de 2010

Atualizando Cândido - VI

CÂNDIDO OU O OTIMISMO, de François-Marie Arouet - Voltaire (1694-1798)

As desventuras da ama da Srta. Cunegundes:

(...) "Cenas parecidas aconteciam, como se sabe, na extensão de mais de trezentas léguas, sem que ninguém faltasse às cinco orações diárias ordenadas por Maomé.
Livrei-me com grande esforço da multidão de cadáveres sangrentos empilhados e me arrastei até uma grande laranjeira à beira de um riacho próximo. Ali, caí de pavor, de cansaço, de horror, desespero e fome. Logo depois, meus sentidos extenuados se entregaram a um sono que mais parecia desmaio do que repouso. Estava naquele estado de fraqueza e insensibilidade, entre a morte e a vida, quando me senti premida por alguma coisa que se agitava sobre o meu corpo. Abri os olhos, vi um homem branco de bom semblante que suspirava e dizia entre os dentes: Ó che sciagura d'essere zenza coglioni!"

(Voltaire)

"O ego é um pobre coitado, espremido entre três escravidões: os desejos insaciáveis do id, a severidade repressiva do superego e os perigos do mundo exterior."

(Sigmund Freud)

"Duas divindades dividem o altar dos ídolos estigmatizados pela espécie humana: o dinheiro e o sexo. Chamaram Deus para mediar as coisas, este devolveu a responsabilidade ao homem que, por sua vez a atribuiu ao mais 'proximo', pois que acumular riquezas e ter sob controle o instinto avassalador da reprodução conflitava profundamente com a sua natureza racional. "

(Jeanne Chaves)


Aisha e Alex: qualquer coincidência é exatamente o que é.


Ela vivia em um pequeno mundo ordeiro, limpo, com as rotinas bem estabelecidas. Não lhe faltava comida e diversão. Havia sempre afeto e broncas quando cometia algum desses desvios juvenis. Logo, todos esqueciam o desgaste, pois além da comida que lhe forneciam com fartura, sempre havia as guloseimas. As crianças lhe davam doces e aprendera a associar o sabor deles ao barulho do plástico sendo manueseado. Com que persistência e firmeza as assediava a fim de que os dividissem com ela, sempre conseguia algum. Podia dizer-se feliz.

Mas um dia, de repente, ela entristeceu uma tristeza sem nome, profunda, bem perto de uma doença psiquíca intratável. Essa tristeza a fez parar de se alimentar, o prazer em comer definhara a despeito dos esforços das pessoas com as quais convivia para alimentá-la. Nada a agradava e seu cansaço era mofino.

Sentia enorme falta de 'não sabia o quê' e essa falta se infiltrava feito líquido pelos vãos da sua vidinha protegida pelos prazeres gustativos.

Foi então que algo aconteceu. Ela o viu. Ele padecia da imobilidade das coisas que são eternas e em cuja constituição da matéria somente se sobrepunha a repulsa e o medo. Mesmo assim, ela o quis com seu querer extenuado.

Decidiu que ele seria seu. E o mimou e acariciou e protegeu. O escondeu de olhos alheios, pois tinha em si que seu instinto satisfeito de modo tão anti-natural levaria ao choque e a desaprovação dos seus conviveres.

Ela tentava alimentá-lo. O aconchegava ao peito mas nada acontecia. O rato de borracha, subtraído dos brinquedos das crianças e aninhado nos pelos do seu ventre, não lhe sugava as tetas. Ele não se movia e o cheiro que recendia dele era o dela própria.

Os dias passavam e seu estado esquálido só piorava, acompanhado de períodos de agressividade, sempre que alguém se aproximava, e períodos de profunda prostração e inapetência.

Em um de seus passeios noturnos, que agora fazia contra a vontade, teve a atenção despertada por uma criatura que o mistério das afinidades sugeria, poderia satisfazer completamente sua 'falta de não sabia o quê'. E ao que parecia, o sentimento era recíproco, pois ele a acumulava de fungadas e lambidas, a cortejava pisoteando, numa dança de acasalamento inócua, o chão ao redor deles.

Mas, a cada investida sobre o dorso dela, de pelos muitos brancos e flocados, ele grunhia e soltava uivos lamentosos como um choro. Seu dono o castrara havia algum tempo e sendo ainda jovem ele apenas se angustiava na impossibilidade de cumprir seu papel pré determinado.

***


Crimes de guerra: escravas sexuais no Iraque e no Afeganistão.Uma menina iraquiana de 12 anos é obrigada a se prostituir nos subsolos de Bagdá, enquanto os guardas privados norte-americanos fazem uma coleta de poucos dólares e fazem fila. As moças são recrutadas no Leste Europeu com a promessa de um trabalho como doméstica em Dubai e depois dali são desviadas e segregadas ao coração do Iraque. As garçonetes dos restaurantes chineses de Kabul, por trás das luzes vermelhas, escondem o segredo que todos conhecem. O artigo é de Angelo Aquaro, do jornal La Repubblica, 20/07/2010.
***

(...)Uma das recomendações da subsecretária-geral da ONU foi que o Afeganistão faça mais para acabar com uma prática muito antiga de manter rapazes com menos de 18 anos (normalmente à volta dos 14) como escravos sexuais de senhores da guerra e comandantes militares. O tema é normalmente considerado tabu e as únicas referências que se encontram são do género: “Há mil anos que se brinca com rapazes, a prática chamada bacha bazi; para quê levantar agora o problema?”

(...)No Norte do Afeganistão, antigos senhores da guerra e comandantes dos mujahedin têm reatado a prática de abusarem sexualmente dos rapazes, e por vezes até de os venderem, contou no ano passado à Reuters o chefe da segurança na província de Kunduz, general Asadollah Amarkhil.

“Alguns homens gostam de brincar com cães, outros com mulheres. Eu prefiro brincar com rapazes”, explicou-se Allah Daad, antigo comandante da guerrilha naquela região.

Fonte:
https://www.feministactual.wordpress.com/category/violencia-sexual/


***

(...) Esses casos são “comuns” dentro das penitenciárias brasileiras: recentemente uma detenta do presídio feminino de Ananindeua relatou ter sido testemunha de uma violação sexual contra uma jovem recém-chegada de São Miguel do Guamá. A vítima era portadora de deficiência mental e foi estuprada por diversos homens dentro de uma cela masculina. A presidiária afirmou que as cenas foram todas filmadas pelos policiais. "Há um mês, os policiais trouxeram uma mulher, que é doente mental, a Nazaré. Os presos a puxaram para dentro da cela e se serviram dela. O investigador ficava de cima filmando com o celular. Foram uns sete ou oito homens que abusaram dela, que estava doida mesmo", contou a detenta.

(...) De acordo com os relatos das presas, muitas vezes elas são obrigadas a manter relações com os presos ou com os funcionários em troca de comida e ou procuram se relacionar com um preso para evitar a violência de outros. “Ficava lá convivendo... ameaça e desprezo. Tinha que tentar ficar com um menino lá para tentar ver se não me faziam mais mal" contou a presidiária Valdecira Pantoja (Idem). A troca do corpo por “benefícios” não são denunciadas por medo da repressão. “As mulheres que sofrem violência sexual ou trocam relações sexuais por benefícios ou privilégios não denunciam os agressores por medo, uma vez que vão seguir sob a tutela de seus algozes” afirma o relatório.

Fonte: Folha de S. Paulo, 29/11/2007).

***

• A cada hora, 16 mulheres enfrentam estupradores.
• Uma mulher é estuprada a cada seis minutos.
• A cada 18 segundos uma mulher é espancada.
• Desde 1974, a taxa de agressões contra as mulheres jovens (idades 20-24) saltou 50 por cento.
• Três em cada quatro mulheres serão vítimas de pelo menos um crime de violência durante a sua vida.
• Apenas 50 por cento dos estupros são comunicados e daqueles relatados, um número inferior a 40 por cento irá resultar em prisões.
• Uma em cada sete mulheres atualmente cursando faculdade foi estuprada.
• As mulheres jovens entre 16 e 19 anos de idade são mais susceptíveis de serem estupradas.

Fonte: http://www.experienceproject.com/l/pt/s/historias/Estat%C3%ADsticas-De-Estupro/188204

Uma hipócrita confraria que diz defender a vida, convenientemente esquecida dos seus sórdidos episódios de Inquisição e morte:

Tudo começou com a notícia de um homem sendo preso em Alagoinha (PE), no dia 26/02, suspeito de abusar da enteada de 9 anos. A garota estava grávida de gêmeos. Segundo a polícia, a criança sofria abusos desde o 6 anos. O homem também mantinha relações com a enteada mais velha, uma adolescente de 14 anos. A mãe da criança pediu para que o aborto fosse realizado. O pai solicitou que não houvesse o aborto, a mãe a princípio acatou, porém depois, a garota deu entrada no Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros, onde a gravidez foi interrompida. A gestação da menina de 9 anos era considerada de alto risco por causa do porte físico que é de 1,33 metro e 36 quilos. O que mais me causa revolta é que a Igreja Católica é contra o procedimento, o arcebispo de Olinda e do Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, o advogado da arquidiocese, Márcio Miranda, o pai da menina grávida, o pároco de Alagoinha, padre Edson Rodrigues, e dois conselheiros tutelares participaram de uma reunião para tentar impedir o aborto. Dom José Cardoso Sobrinho, acredita que a violência sofrida pela menina não justifica o aborto. “A menina engravidou de maneira totalmente injusta, mas devemos salvar vidas”, disse. O advogado da Arquidiocese de Olinda e Recife, Márcio Miranda, afirmou que vai denunciar o caso ao Ministério Público de Pernambuco ainda nesta quarta-feira (4). A ideia é impedir que o aborto aconteça. Mas aconteceu. A criança, a mãe, e o médicos resposáveis pelo aborto foram excomungados pelo Vaticano.


Fonte: http://adminhavida.wordpress.com/2009/03/04/vergonha-igreja-catolica-e-contra-aborto-de-garota-de-9-anos/

E segue a Ordem Ocidental machista, concubinada com a Ordem Oriental machista, doutrinadoras da transferência de culpa pela absoluta incapacidade do homem em controlar seus desejos obscuros e insaciáveis através das suas propaladas racionalidade e religiosidade, para a mulher; tida como apêndice imperfeito do homem desde a Grécia Antiga.
A humanidade, subjugada por dogmas incongruentes há mais tempo do que ela se conhece, os reproduz na política, nas escolas, nos locais de trabalho, nas igrejas, na família, no indivíduo, sub-repticiamente, metástases de si mesma. Apodrece sem nunca ter amadurecido. A discriminação e a crueldade sexual apenas mudam seus rótulos. Como uma empresa falida muda de nome, inventa valores, e continua a disseminar seus produtos e serviços funestos como se fossem sagrados.

Jeanne Chaves