quinta-feira, 25 de junho de 2015

Por Um Futuro, Ainda Que Não o Vejamos Passar



          É do Direito negar um crime descoberto. Se nenhum foi cometido é direito assumir não ter havido nenhum. É próprio da Justiça a justiça justa ou a justiça possível no espectro das impressões pessoais oriundas das exposições às experiências de vida ideal externa de quem julga, sendo que ambas, justiça justa e justiça possível são cabíveis por fraude voluntária do pensamento ou por consciência involuntária. Leis não passam de referenciais, e a depender do contexto da moral das sociedades, são limítrofes, de éticas mutantes, à deriva das vontades individuais. Uma mentira difundida por séculos a fio torna-se verdade, é verdade, e, é verdade que uma verdade exaustivamente repetida por séculos também se torna verdade, e, é verdade que a distância entre uma e outra é a dúvida, porém, a quantos interessaria conhecer todas elas? Quantos as suportariam nessa altura da trajetória? Por isso a vida é curta, e quando extensa a salva as demências. Simulações antes de senilidade são bem aceitas, se aprazíveis, e os subterfúgios para elas dependem de ao que os sentidos foram expostos. Os sentidos fazem a mente e a mente, não raro, os engana se os sentidos se enganam. Realidade é a soma das fraudes das utopias convictas, e funcionam como se científicas. Como é impossível um cego descrever com precisão as cores de um pôr-do-sol, tal uma pessoa de visão normal, se lhe falta precisão no vocabulário, ainda mais não fosse o fenômeno em si impreciso em cada dia. As nuvens nunca são as mesmas no céu e o céu é muito vasto acima dos ventos que movem as nuvens. A luz de revelar as coisas também não é nunca a mesma. Como é impossível a um surdo descrever o som da queda d'água de uma cachoeira com precisão ele descreverá o impacto dos decibéis das ondas sonoras em seu corpo como uma pancada, e caso a queda seja de pouca quantidade de água, ele jamais descreverá o fenômeno com precisão, tal uma pessoa de audição normal a quem faltasse o vocabulário para explicá-lo. Mudos gesticulando Libras funcionais para quem não compreende este vocabulário e uma pessoa capaz de articular fonemas, limitada no entendimento da linguagem.


               Somos instintivos e sensoriais, e foi preciso lançar mão do uso das especializações, em assim sendo, o mundo cercou-se de fragmentos difíceis de serem juntados todos ao mesmo tempo, e mais do que isso, difíceis de serem processados ao mesmo tempo. Lentamente eles se vão agregando em partes convenientes ao bem estar dos sentidos de quem os possui funcionais como epifania, e com objetivos funcionais, vagando em superlativos comerciais e minimizações desqualificantes, fadados ao exagero e justificados por estatísticas.

                Para o cidadão indistinto, nas bases das pirâmides sociais, testar intenções e ideias por trás delas de maneira coerente e menos empírica nunca foi tão urgente como forma de garantia de uma sobrevivência igualitária e racional, a partir do indivíduo até os sistemas sociais e governamentais que tal conjunto forma. Os empirismos já prestaram os serviços e desserviços que podiam à Humanidade. As utopias nunca foram tão desnecessárias às revoluções que a Humanidade necessita, embora tenham carregado até esse ponto, natural e imprescindível de reversão dos pensamentos cíclicos, os indivíduos, as sociedades, e as estruturas dos governos de cada País. Jamais chegamos a um ponto da História da Civilização no qual urgisse a necessidade de sermos tão demasiadamente honestos com nós mesmos em tudo, ainda que em detrimento das religiosidades, ideologismos, e ideologizações políticas imbuídas das fraudes intelectuais que lhes são próprias. Nunca foi tão urgente passar a limpo as imposições de pensamentos que se desdobraram em ordens sociais e econômicas e seus crimes contra a Livre Consciência, em verdade, cometidos em nome dela.

                Do domínio do fogo ao domínio da tecnologia de beneficiamento do Urânio das bombas atômicas, passando pela fraude ingênua da Costela de Adão como órgão reprodutor quando ainda não era possível visualizar as células reprodutivas porque simplesmente não havia as lentes de aumento para tal. Não havia a tecnologia disponível para tanto, e no entanto o mito persiste, completamente embasado de ignorância. É como descobrir o Bóson de Higgs ou Partícula de Deus, uma metáfora da Ciência contaminada do pensamento religioso, passando por cima do conhecimento de que o cromossomo Y jamais poderia ter vindo primeiro na escala evolutiva puramente pela falta de condições bioquímicas para isto. Desfazer mitos aparentemente insuperáveis, como o de um deus à frente de tudo, quando quem está à frente de tudo, manipulando os deuses que cria para sujeitar, inutilmente o homem, é a mente humana e sua diversidade de linguagem e entendimento, que adapta seus deuses às suas misérias adaptando, igualmente, as preces. E até se prove o contrário, a concepção de deus é extremamente terrena. Pode haver um recôndito na Terra no qual haja ordem e ordenação social apenas e essencialmente se seguindo os Dez Mandamentos de forma coletiva, mas há, decerto, coletividades detentoras de sofisticados códigos legais, com dezenas, centenas, e milhares de regulações para todos os setores da sociedade e para o indivíduo que não cumprem nem os Dez Mandamentos, elaborados na premência de uma desorganização social existente em uma situação literalmente desértica, segundo a História, nem cumprem seus sofisticados códigos legais.

                   Horizontalizar os poderes e as capacidades, inclusive a faculdade de pensar, e alguns poderes, de fato, primar pelas suas extinções. Seus lutos resolvíveis. Reorganizar as concepções com vistas a uma nova ordem de pensamento, reciclando os pensamentos testados e dispersos em fragmentos. Nada é mais conveniente à estática, à inércia, do que o bandeamento do pensamento em lados opositores, que devam ser erguidos como bandeiras no campo de batalha dos idealismos. A Humanidade, então, haverá de se debruçar sobre suas convergências mais do que sobre divergências.

               Temporal e mortal é o Homem. O Tempo e a mortalidade o desorientam e daí a incapacidade em se perceber como Sistema, percebe-se como, no máximo, integrante do conjunto de valores que tenta praticar em conflito com indivíduos que assumem, como forma de convivência social, os mesmos valores e não os praticam. Ao se afirmar, por exemplo, que suas raízes coloniais escravagistas justificam sua condição social, seu aprisionamento mental, e sua condição social, se fornece a desculpa perfeita para que assim o indivíduo se acomode nessas condições, não obstante, todos os falsos inexplorados ou subtraídos da sua história coletiva. Daí as doenças da mente, as somatizações, que nem sempre podem ser atribuídas a um gene deletério, deficitário, recessivo, dominante ou mascarado, esses a Ciência já é capaz de localizar e classificar, e permeiam todos os tipos genéticos humanos, por conseguinte, restam as doenças da consciência difusa de uma realidade distante dos sentidos, que por justiça biológica prescinde, enfim, de todos os concomitantes términos de cada porvir passado.

             Tendo se mantido inexoravelmente através dos séculos, os instintos primários de sobrevivência: abrigo, alimentação e reprodução, não obstante os saltos de desenvolvimento tecnológico, que não implicam diretamente em melhor qualidade de sobrevivência coletiva, ainda assim, esses instintos acompanharão o Homem como acompanha qualquer ser vivo, e por causa deles, não como qualquer ser vivo, o Homem continuará exaurindo e matando o Homem, auxiliando seus próprios desequilíbrios sociais até a extinção, pois que as barreiras geográficas de isolamento praticamente não mais existem.  As barreiras políticas no que tange a convivência global são vulneráveis e belicistas, e a paz nada mais é do que uma intermitência nos estados de guerra sejam eles pessoais, regionais, continentais ou mundiais. Mas nossa escolha não deveria se dar entre um holocausto lento no limite do inassimilável, ou voraz no limite do que nunca poderá ser profundamente conhecido. Mais do que pela funcionalidade das adaptações do pensamento às transformações das civilizações humanas, deverá se dar através da inteligência emocional que o homem atinja a racionalização dos seus instintos primários com menor angústia existencial, porém, se conseguir aprender a reaprender, na busca das terceiras vias e quantas for necessário, sem culpas, nem julgamentos, nem desculpas, nem perdões. Sem nada que o fragilize além do talento da índole para a fragilidade, e este deverá ser suplantado pela vocação para sobreviver.



Jeanne Chaves