quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O Quarto Poder e As Massas de Manobra Políticas

"Quando eu lembro da massa da mandioca, mãe... A dor da gente é dor de menino acanhado, menino bezerro pisado, no curral do mundo a penar..."

Há que se admitir, fazer política e discurso político na Colônia, é muito fácil. Passemos diretamente aos elementos dessa facilidade:

1) A população de cidadãos completamente analfabetos no Brasil soma hoje impressionantes 14,2 milhões. Sim, já foi bem maior este número, no entanto a metodologia aplicada pelo IBGE se utiliza da técnica da amostragem para realizar projeções estatísticas e, convenhamos, modelos matemáticos às vezes se prestam razoavelmente bem em substituição ao estudo 'in locu' das situações, por outro lado levanta questões curiosas e até filosóficas. Explico, comparativamente ao ano de 2003, quanto o número de analfabetos no país girava em torno de algo superior à 16 milhões, esta aparente redução dos índices em dois dígitos, não quer dizer, obrigatoriamente, uma verdade terminal. Pode querer dizer, apenas, que quando se pesquisa um cidadão ou uma família, se é que estes dados são gerados a partir da fonte, mas se são gerados a partir de dados coletados pelo MEC diretamente das escolas, qual o desvio padrão a ser aplicado em ambos os casos, nesse último, os números são 'descobertos' comparativamente a quê? Já que a escola é um sistema que só pode dar conta do que produz, e, o termo é exatamente este. Bom, mas a questão não é esta, embora seja importante. A questão é: o recrudescimento dos índices de analfabetismo está ligado à metodologia ou ao óbito dos cidadãos nesta condição? Já que a faixa etária na qual as pesquisas são aplicadas vai dos 14 aos 65 anos. Por violência, principalmente, nas faixas etárias mais jovens e por doenças, essencialmente, na população de idosos?
Então poderíamos dizer que o analfabetismo morreu em dois dígitos ou que a estatística se presta parcamente a visualização de projeções, mas não a resolução do problema. 2) Em 2001 o Instituto Paulo Montenegro, ligado ao IBOPE, principiou a fazer levantamentos chamados Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF), e em 2005, concluiu que apenas 26% da população brasileira lê e escreve plenamente. Pasmem senhoras e senhores! Somente, um em cada quatro brasileiros tem plena capacidade de ler, compreender e elaborar um texto. O conceito de analfabetismo funcional é difundido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). Conclui-se então que essa massa de pessoas atua em sociedade, também, como inocente útil ao sistema dessa democracia, pois consegue, involuntariamente, auxiliar na apresentação da redução de índices de analfabetismo absoluto, mascarando os índices que são necessários, em termos de educação, para um país ser classificado como primeiro segundo, terceiro mundo e por aí vai. Contudo, é inapto para a elaboração de um senso crítico coerente com a realidade que o cerca. Esta situação perversa tem lá suas raízes históricas num tempo em que a elite intelectual subsidiava a elite política, em contra partida, a elite política se mantinha efetivamente no poder durante anos à fio, beneficiando os extratos sociais que lhes era conveniente. Qualquer sucessão ocorria entre os mesmos políticos dos dois partidos oficiais existentes, MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e ARENA (Aliança Nacional Renovadora), apesar da proposta nos nomes, cortinas de fumaça. Num tempo, em os analfabetos não tinham direito ao voto nem se elegiam.

O MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização) se propunha, então, nos primórdios do Regime Militar, a erradicar o analfabetismo no Brasil, com o objetivo de angariar licitude para um governo que não era 'legítimo'. Trocando em miúdos: o governo militar era legal, mas não era legitimado pelo povo. O voto dos alfabetizados era de suma importância no processo da eleição de políticos 'biônicos', propostos por um colegiado militar e referendados através do voto popular. A escola pública era naqueles tempos o que ainda é nos dias atuais da democracia brasileira 'um aparelho ideológico' estruturado para reproduzir e atender as demandas políticas e econômicas do país, exclusivamente. Não há necessidade de uma 'massa pensante', mas de uma que faça só o que é necessário.

A otimização dos discursos políticos é de tal monta e, tão capcioso nas promessas sobre educação, que se fossem cumpridas, certamente, um número enorme dessas criaturas políticas não estaria parasitando nas Assembléias Legislativas, nas Câmaras Municipais, no Congresso e no Senado Federal. Cabe perguntar quem nasceu primeiro nesse ciclo vicioso... O político analfabeto funcional? (Depois de eleito, analfabeto de 'princípios' funcionais). Ou o inocente útil alfabeto funcional? E agora, uma rápida conversão matemática, para em números mais próximos do real, sabermos quantos somos ao todo: com aproximadamente 160 milhões de habitantes adultos, temos uma população de alfabetos funcionais de cerca de 120 milhões com a aceitação inadvertida da seguinte proposta de existência: "Dê-lhes uma possibilidade mínima de ascensão social, uma ilusão, a esperança de consumir mais. Mas lhes tire sobre o que pensar do contrário eles acreditarão ser verdade o que pensam.” 3) Sabendo que os estratos sociais de equilibram sozinhos, o discurso dos políticos utiliza a linguagem certa para atender gregos e baianos, os muito ricos, e os muito pobres, os privilegiados de conhecimento e senso crítico, o analfabeto, e o analfabeto funcional, as minorias e as maiorias. O segredo é não apresentar contradições na proposição das ações e, relevar ou desconsiderar os conflitos de interesses que surgiriam, isto, administram se eleitos, pois eles serão o poder legal e legítimo.
Por todas estas circunstâncias é que a estatística é indispensável à composição do cunho do discurso. Por ela, é possível projetar, por exemplo, que a população de usuários de drogas ilícitas representa um potencial insofismável e em franca expansão no Brasil. Curioso, é o modo que eles tratam as drogas como se estas proliferassem entre todos os estratos sociais, todos os poderes: legislativo, executivo e judiciário, como se fosse uma entidade com vontade própria, isentando o cidadão de culpa pelo 'sim' ao uso delas e, se eximindo das responsabilidades pela proliferação delas numa demanda crescente.

Não sei se é 'jumentice', oportunismo, ou ingenuidade, o fato é que a maioria dos candidatos nestas eleições majoritárias resolveu abraçar a causa da descriminalização do uso de drogas. O aspecto mais gritante dos discursos é a banalidade com que o fazem, sem considerar se a descriminalização fomentaria o tráfico, o que é mais provável.


Sem considerar a angústia e o sofrimento das famílias e dos amigos do usuário de drogas, pois mesmo que ele tenha à disposição, atendimento em clínicas especializadas no tratamento de drogados, quando retornam, as drogas estão lá, nas ruas e as histórias de sucesso pessoal na superação do vício, infelizmente, não podem constar das estatísticas, nem de forma mascarada.

Sem considerar que mais de oitenta por cento dos crimes que ocorrem nas capitais do país estão relacionados às drogas. Sem considerar que o tráfico de drogas é um grande e concorrido negócio, que se utiliza da ciência para viciar e vender mais, exemplo disto é o 'ecstasy', e, o 'desiree' (Canabis e crack) associados. E sem considerar os constrangimentos impostos aos não usuários nas ações da polícia.

Perdoem-me, mas não consigo esse desprendimento cristão e conformado. Por que quando um usuário diz sim as drogas está jogando não só com seu futuro, mas com os do não usuário, este fica refém do tráfico e da corrupção que corre frouxa dentro dos órgãos que deveriam coibir o uso e o tráfico de drogas. Mas, estão com suas estruturas administrativas tão podres que dão margem a que se utilizem delas como subterfúgio para a descriminalização. Infelizmente, um brutal atestado de incompetência dos poderes constituídos, assinado com letras garrafais. É mais fácil acreditar que o controle rígido desses órgãos, a punição sem os carinhos, que normalmente recebem os corruptores institucionalizados, é menos eficiente do que uma reforma tributária que faculte uma melhor distribuição de renda? O controle de nossas fronteiras, que mais parecem uma passarela? Sem hipocrisia, é mais fácil crer que o dinheiro do contribuinte coloca o Estado contra ele, mais do que o ajuda.

E vêm uns alienados-analfabetos funcionais-filósofos-de-ocasião, falar em Felicidade Interna Bruta (FIB), então eu pergunto? Com ou sem drogas? Com ou sem violência? Lavando as mãos com plebiscitos sobre o uso de drogas ou pondo elas na 'massa' e trabalhando o que precisa ser trabalhado?

Entretanto, o que esperar de uma massa que vai às ruas em marchas pela maconha, para atender seus anseios pessoais egoísticos, sua satisfação 'transcendental', suas fugas da realidade, em detrimento da compreensão dos fatores políticos, econômicos e sociais da pobreza neste país? Em detrimento de uma mudança real? Sem se importar se o aumento da produção e proliferação de drogas aqui forçaria um escoamento para países mais disciplinados e sérios na sua legislação e postura sobre o assunto, promovendo os mesmos conflitos e propiciando o aumento do consumo no mundo?

Nosso censo de coletividade nunca existiu, ou está obliterado pela nossa característica utilidade inútil. Nunca foi tão fácil vender idéias incongruentes neste país.

À caminho do tão esperado crescimento econômico, se atropela os passos, precocemente e, se o risco é calculado ou não, o analfabeto funcional é incapaz de se perguntar a quem interessa este estado de coisas.
Reconhecido o 'Quarto Poder', legítimo, mas não legal, o tráfico de drogas, poderemos dizer, sim, que ele surgiu 'do povo para o povo' brasileiro, com a anuência e colaboração dos poderes legais e legítimos constituídos.


 

Jeanne Chaves