sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Epifania de Um Ateu



Devia não empenhar-se em crer. Anulou deus até ao espermatozoide de uma mosca, e, ainda assim, ele é maior  que o inseto. Devia manter nos seus esfíncteres a turgidez da palavra no mais estrito controle, mesmo quando o pragmatismo essencial do orifício anal lhe escorresse pelas pernas diante daquela mulher religiosa por obrigação, e sem pudor. Se ela compreendesse que não adiantava cobrar-lhe o impossível, uma simples  pressão de  esfíncter para que não emporcalhasse a louça sanitária e o piso clorado do banheiro, ficaria grato por ela fazer de conta que não via as fezes que ele  negava como quem nega deus. Não eram dele. Eram fezes onipresentes. Porém, nunca admitiria que quase a amava por não dizer a verdade. Ela se vendera. A mulher velha, cujos desterros revelavam-se no pouco viço dos braços, de ventre gordo de fibromas, se vende pelo odor dos seus excrementos, lhe serve do banho à boca. Não vale respeito.

Caridade fizera-lhe um velho amigo de frequentar bordéis. Ensinou-lhe que há menos preço no sexo pago. O substituto do seu pai que o iniciara na vida mundana de macho somente para que ele deixasse a irmã em paz. A mais nova e ignóbil, com seus peitinhos espetando os olhos. O amigo que o ajudou na caçada às fêmeas e o fez saber que sem outro macho a vida seria impossível. Os dois cercam. Um incita. Os dois copulam. Os dois se protegem do macho próximo como os machos próximos se protegem dos próximos. O amigo o presenteara com um massageador prostático comprado numa dessas catedrais luxuosas erguidas para se comungar o dinheiro. O embrulho em papel sofisticado não  o enterneceu. Comovia-lhe o efeito do presente bem acoplado nas entranhas. Fazia-o economizar a musculatura do braço esquerdo usado na luta com o pragmatismo ateísta. Ele era um homem justo para com a sua natureza, até ao pânico. Como arrancar os brotos da magnifica ignorância se nela vicejava,  se  auto afirmava? Seu fim seria o dele, que sempre cultivou o suicídio nos outros com a vaidade de quem pudesse fazer melhor. Mas não fez.

Perdoava-se em meio aos excrementos involuntários diante daquela mulher de ancas largas. Imaginando se teria tido excitação para cavalgá-la em um quarto escuro com os cheiros orgânicos de secreções e bordéis.

Há ainda outra mulher na sua insônia. Pandora havia aberto as pernas, tal Virgem Maria, para o nascimento do primeiro homem que não era bom nem mau e foi estelionatário depois do segundo. Sim, a mulher era a raiz de todo o mal, e maldito é o fruto do seu ventre, ele. A caixa, esse simbolismo existencial, transferia tão somente a forma que originalmente seria de um útero, pois do contrário se incorreria em afeminar demais o Ser, e ele sempre precisará de seus homúnculos cósmicos presumidos.

Aquela outra mulher tem lhe feito perder o sono por muitos dias e noites. Por várias noites e dias os quilômetros sobre os quais seu braço esquerdo precisa se estender à procura da vasilha de urinar o fez acordar sem dormir, extenuado de pensar nela.

Comparava o homem ao cavalo: viril, trabalhador e domesticável. Que ousadia! Pensava, logo morria longamente. Quantas criaturas existiam no impulso? Tinha pênis, logo era bicho! Parvo Quíron! Ria-se.

Ah! Aquela mulher! Usava as inconsistências do homem contra ele que preservou  a mulher do pai sem ejacular. O que lhe fazia além de desejar a vagina antagônica? Contrações que lhe expeliriam vivo da endogamia de deus. Aquela mulher destruiu antes os mitos que ele massacrava. Afetuosamente, maculou de amor o ódio, e de desprezo a paixão, para eliminar os extremos. O que faria com o meio restante? Ela matou deus com a sua espada, com seu próprio falo. O assassinara com esmero melhor do que o seu. Sem possibilidade de retorno ao meu parricídio existencial. Serviu seu focinho em uma baixela primípara. Ele só necessitava um deus para esquartejar todos os dias depois de copular com o massageador. Quando as putas ficaram seletivas demais por causa da demanda, e ele jamais aprendera a seduzir nenhuma. Aquela mulher com vagina, ossos, músculos e cérebro não daria a vida por nada que não tivesse saído do seu útero o fez acreditá-la sem que sequer a amasse, como  cumpria seu ódio apaixonado de deus. Ela não daria a vida por ele. Ficou por perto candidamente com a empáfia de quem não fugiria de ninguém que não pudesse caçá-la. Ficou ali na monotonia uivante do morro de um Heatchcliff necrófilo. Dele e de deus ela é a tumba.

Setenta e oito anos embainham a sua espada flácida, desarmada sobre um monte de pelos brancos crescidos no púbis da armadura torta. Não há tempo para salvar qualquer deus que o salve. Uma sonda para a sua uretra, pelo amor de Deus!